Muitos são os indicadores utilizados para mensurar em que pé anda a tão almejada igualdade entre homens e mulheres. O avanço da presença feminina no mercado de trabalho; a redução da diferença de salário entre os dois sexos; e o significativo número de mulheres nos bancos escolares sinaliza ganhos.
No entanto, os altíssimos índices da violência praticada contra as mulheres por homens com quem elas mantêm – ou mantiveram – vínculo de afeto flagram uma triste realidade: ainda vivemos em uma sociedade patriarcal. Considerada como sexo frágil, o homem se reconhece na condição de proprietário de seu corpo e do seu desejo, se arvorando no direito de puni-la sempre que o seu comportamento se afasta do modelo de obediência que lhe impõe.
A violência doméstica, até bem pouco, não merecia a mínima atenção. A omissão estatal tinha como justificativa que se tratava de questão privada. Ou seja, em briga de marido e mulher ninguém devia mesmo botar a colher. A Lei dos Juizados Especiais, ao considerar a lesão corporal leve como delito de pequeno potencial ofensivo olvidou-se que nas relações de poder – ainda presente no âmbito doméstico – não é possível delegar à vítima a iniciativa de ver seu agressor processado.
Com o advento da Lei Maria da Penha a violência intrafamiliar ganhou visibilidade. Pela vez primeira passou-se a quantificar os delitos perpetrados no âmbito doméstico e os números assustaram. Para corrigir históricos equívocos foi afastada, modo expresso, a incidência da Lei dos Juizados Especiais e proibida a aplicação de pena de natureza pecuniária, como o pagamento de cestas básicas. Mas a nova legislação foi além, impôs à autoridade policial o dever de tomar algumas iniciativas e encaminhar o pedido de aplicação de medidas protetivas ao judiciário no prazo de 48 horas. Com essas e outras tantas providências salutares, as mulheres sentiram-se protegidas e encorajadas a denunciar a violência de que são vítimas. Depois de levar o fato ao conhecimento da polícia, tinham a segurança de não mais ficarem reféns do agressor que não poderia ameaçá-las para “retirar a queixa”.
No entanto, recente decisão do STJ acaba por desfigurar a Lei Maria da Penha ao condicionar a instauração do processo criminal à representação da vítima de lesões corporais leves. No entanto, não há como exigir que a mulher, depois de ter denunciado o agressor, tenha que retornar à polícia ou comparecer a juízo para formalizar a representação.
Indispensável é reconhecer que o registro da ocorrência levado a feito pela autoridade policial, a pedido da vítima, constitui a representação. Afinal, trata-se de manifestação de vontade de ver o agressor punido. Nada mais é preciso para que o Estado assuma o encargo de fazer justiça.
Este é único jeito de não transformar em perdas os ganhos trazidos pela Lei Maria da Penha.
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