quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Especialistas contestam a 'síndrome do ninho vazio'

Desde os anos 70, os especialistas em relacionamentos popularizaram a idéia da "síndrome do ninho vazio", um período de depressão e de perda de propósito que aflige os pais, e especialmente as mães, quando os filhos saem de casa. Dezenas de sites e livros prometem ajudar os pais a enfrentar essa transição, e a editora Simon & Schuster tem até uma série especial dedicada às vítimas da síndrome.

Mas o número crescente de pesquisas parece sugerir que o fenômeno foi compreendido de maneira indevida. Embora a maioria dos pais claramente sintam falta dos filhos quando estes saem de casa para estudar, trabalhar ou se casar, a liberdade ampliada e a redução na carga de responsabilidades são apreciadas.

E a despeito da preocupação frequente com a possibilidade de que os casais descubram nada ter em comum exceto os filhos, uma nova pesquisa, publicada na edição de novembro da revista Psychological Science, demonstra que a satisfação conjugal na verdade cresce quando os filhos enfim se vão.

"Não é como se as pessoas tivessem vidas horríveis", diz Sara Melissa Gorchoff, especialista em relacionamentos adultos na Universidade da Califórnia em Berkeley. "Os pais são felizes com os filhos. Mas os casamentos deles muitas vezes melhoram quando as crianças se vão".

Embora isso talvez não surpreenda alguns pais, compreender por que os relacionamentos conjugais dos pais, cujos filhos deixaram a casa da família melhoram, pode oferecer lições importantes para a felicidade conjugal de casais que estão a anos de distância de uma casa sem filhos.

Um dos aspectos mais desconfortáveis do estudo se refere ao efeito negativo que crianças podem ter sobre relacionamentos antes felizes. A despeito da idéia popular de que crianças aproximam casais, diversos estudos demonstram que a satisfação marital e a felicidade do casal em geral despencam quando chega o primeiro bebê.

Em junho, o Journal of Advanced Nursing publicou um estudo conduzido pela Escola de Enfermagem da Universidade de Nebraska sobre o índice de felicidade conjugal de 185 homens e mulheres. O índice começava a cair durante a gestação e continuava em queda quando as crianças atingiam os cinco meses e os 24 meses. Outros estudos apontam que casais com dois filhos se saem ainda pior do que casais com um filho só.

Embora ter filhos claramente traga felicidade aos pais, os apertos financeiros e de tempo podem desgastar um relacionamento. Depois que um filho nasce, os casais têm apenas um terço do tempo de intimidade a dois que tinham antes de terem filhos, de acordo com pesquisadores da Universidade Estadual do Ohio.

A chegada dos filhos também atribui parte desproporcional das responsabilidades domésticas às mulheres, e isso é uma fonte comum de desentendimento conjugal. Depois dos filhos, o trabalho doméstico das mulheres cresce três vezes mais que o dos homens, de acordo com estudos do Centro de População, Sexo e Igualdade Social da Universidade de Maryland.

Mas boa parte das pesquisas sobre o efeito dos filhos na felicidade conjugal se concentra nos anos iniciais. Para compreender o impacto em prazo mais longo, os pesquisadores de Berkeley acompanharam os índices de satisfação conjugal de 72 mulheres que são parte do Estudo Longitudinal Mills, no qual um grupo de alunas do Mills College foi acompanhado pelos pesquisadores durante 50 anos.

O estudo é importante porque acompanha a primeira geração de mulheres que tentou equilibrar as responsabilidades familiares profissionais e empregos externos. No estudo sobre a síndrome do ninho vazio, os pesquisadores compararam a felicidade conjugal de mulheres na casa dos 40 anos, quando muitas ainda tinham filhos morando consigo; na casa dos 50 anos, quando alguns dos filhos já haviam saído de casa; e na dos 60, quando virtualmente todas viviam separadas dos filhos.

Em todas as situações, as mulheres cujos filhos já haviam deixado o lar apresentaram felicidade conjugal maior que a das mulheres que ainda tinham crianças em casa. O resultado se assemelha ao de um estudo apresentado na reunião da Associação Psicológica Americana em 2008, o qual acompanhava uma dezena de pais entrevistados quando seus filhos se formaram no segundo grau e 10 anos mais tarde. O pequeno estudo também indica que a maioria dos pais se sente mais feliz em termos conjugais depois que os filhos se vão.

Embora os pesquisadores de Berkeley tenham oferecido a hipótese de que a maior satisfação se deve ao fato de os casais passarem mais tempo juntos quando seus filhos saem de casa, a maioria das mulheres no estudo afirma que passa mais ou menos o mesmo tempo com seus maridos quando isso acontece, mas a qualidade desse tempo melhora.

"Há menos interrupções e menos estresse quando os filhos saem de casa", disse Gorchoff, de Berkeley. "Não é que os casais fiquem mais tempo juntos depois que os filhos se vão, mas a qualidade do tempo de que o casal compartilha melhora".

Ela aponta que a lição oferecida pelos resultados parece ser a de que os pais precisam encontrar mais tempo livre de estresse para passarem juntos. Na amostra estudada, a única variável que melhorava quando os filhos saem de casa era a satisfação conjugal. Em termos gerais, os pais se declaram igualmente felizes quando têm filhos em casa e quando não. (O que acontece quando filhos adultos voltam à casa dos pais porque suas perspectivas de emprego desapareceram em função de um desastre econômico não foi examinado nos estudos).

"As crianças não arruínam as vidas de seus pais", disse Gorchoff. "Elas só dificultam interações mais agradáveis entre eles".

Tradução: Paulo Migliacci
The New York Times

Fonte: Terra

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