domingo, 28 de novembro de 2010

Análise - Videogames e violência

Opiniões se dividem e buscam soluções

Pe. John Flynn, LC

ROMA, domingo, 28 de novembro de 2010 (ZENIT.org) – O Supremo Tribunal dos Estados Unidos ouviu, há pouco tempo, argumentos para decidir se deve ou não proibir a venda ou locação de videogames violentos a menores de idade.

Segundo a informação da imprensa, a reação dos juízes foi contraditória, com opiniões que não se adequavam à divisão normal que costuma haver entre eles na maioria das questões legais.

O caso tem a ver com uma lei da Califórnia, de 2005, que proíbe a venda de videogames excessivamente violentos a menores de idade. Foi assinada, como alguns observavam ironicamente, por um antigo ator, conhecido por seus filmes violentos, o governador Arnold Schwarzenegger. Após ser invalidada nos tribunais inferiores, a batalha pela lei chegou agora ao Supremo Tribunal.

As questões em litígio vão desde por que só os videogames deveriam receber um tratamento especial, e não também os quadrinhos e a música rap, até se poderiam inclusive ser considerados uma forma de arte, informou o Wall Street Journal no dia 3 de novembro.

“Neste país não temos a tradição de dizer às crianças que devem ver as pessoas batendo na cabeça dos colegas com um pedaço de pau enquanto estes suplicam piedade, pessoas que não têm dó e que decapitam, que atiram nas pernas das pessoas”, afirmou o juiz presidente John Roberts, segundo a reportagem de 2 de novembro da Associated Press.

Pelo contrário, o juiz Antonin Scalia afirmou: “Preocupa-me a Primeira Emenda, que diz que o Congresso não deveria criar lei alguma que limitasse a liberdade de expressão”. E acrescentou: “Nunca se entendeu que a liberdade de expressão não inclui representações da violência”.

Segundo o texto da Associated Press, os tribunais de outros seis Estados anularam proibições similares.

Liberdade de expressão

“Os videogames, inclusive os violentos, permitem que os jogadores tenham liberdade de expressão, como os instrumentos permitem que os músicos tenham liberdade de expressão”, escreveu Daniel Greenberg, roteirista e desenhista de videogames, em um artigo de opinião no Washington Post, em 31 de outubro.

“Ninguém no governo está qualificado para decidir que jogos não permitem a liberdade de expressão, ainda que a liberdade de expressão seja de um menino de 15 anos”, afirmou. Também argumentou que as autoridades da Califórnia não tinham conseguido apresentar evidências de que os videogames causam danos psicológicos aos menores.

Após a apresentação de argumentos ao tribunal, um redator do PC World, JR Raphael, também condenou a lei em seu site, em um artigo sem data.

Deixando de lado assuntos de princípios, apontou os problemas práticos da legislação. O texto da lei define um videogame violento como aquele “no qual o leque de opções disponíveis a um jogador inclui assassinar, mutilar, desmembrar ou abusar sexualmente da imagem de um ser humano”, de forma “declaradamente ofensiva”, apela aos “interesses desviados mórbidos” de uma pessoa e carece de “verdadeiro valor literário, artístico, político ou científico”.

“Quem vai declarar sobre que videogames são 'declaradamente ofensivos' e quais não são?”, questionou. Também citou uma pergunta do juiz Antonin Scalia: “O que é um videogame violento 'desviado', em oposição a um videogame violento 'normal'?”.

Gregory K. Laughlin, diretor da biblioteca de Direito da Faculdade Cumberland de Direito da Universidade Samford (Alabama), mostrou-se a favor da lei, em um texto divulgado no dia 2 de novembro, no site da revista First Things.

Ele admitiu que os pesquisadores se mostraram divididos sobre a existência de um nexo entre os videogames e os comportamentos violentos. Também reconheceu que a questão é a liberdade de expressão. Não obstante, afirmou que, no passado, o Supremo Tribunal sustentou que haveria restrições para os menores quanto ao tema da liberdade de expressão.

Há mais de 40 anos, indicou Laughlin, o Supremo Tribunal manteve vigente uma lei de Nova York que restringia o acesso dos menores às revistas pornográficas. Em sua sentença, o tribunal explicou que o Estado estava justificado na hora de agir, não com base em uma certeza científica sobre o dano causado, mas porque “os pais têm um interesse no desenvolvimento ético e moral dos seus filhos e têm o direito de contar com a ajuda do Estado ao educar seus filhos para que sejam adultos éticos e morais”.

Laughlin fez referência a outras sentenças e concluiu citando uma opinião que se remonta a mais de 60 anos, do juiz Robert Jackson, quem dizia: “Existe o perigo de que, se o Tribunal não moderar sua lógica doutrinária com um pouco de sabedoria prática, pode converter a Lei de Direitos constitucionais em um pacto suicida”.

Pesquisas

No começo deste ano, aconteceu um debate similar na Austrália, quando o departamento do Fiscal Geral federal recebeu propostas sobre a possibilidade de introduzir a categoria para maiores de 18 anos nos videogames.

Ainda não se anunciou nenhuma decisão, mas em maio o governo publicou um informe sobre o material recebido do público e de organizações. Houve 34 comunicações da comunidade, da Igreja e de grupos da indústria. Destes, 18 apoiavam a introdução da classificação para maiores de 18 anos, enquanto 16 se opunham à sua introdução.

Os grupos da indústria do entretenimento estavam a favor de uma categoria para adultos, que lhes permitiria vender jogos que atualmente não são permitidos na Austrália. Em suas comunicações, sustentaram que existe uma falta de evidência científica que conclua que os meios violentos causam ou desencadeiam comportamentos violentos. Também afirmaram que não há provas de que a violência dos videogames seja mais prejudicial que a violência dos filmes ou de outros meios.

Algumas organizações cristãs e familiares se opuseram à criação da categoria de adultos nos videogames. Em sua comunicação, o Australian Christian Lobby afirmou que já se estendeu na comunidade a preocupação pela violência na mídia e é maior quando se fala de videogames.

Manter uma proibição aos videogames não adequados para menores é – afirmaram – uma postura “baseada no bom senso e na pesquisa apoiada na premissa de que a natureza interativa dos jogos de computador causa que seu conteúdo tenha um maior impacto nos jogadores que os efeitos de representações de cinema parecidas de condutas violentas ou sexuais nos espectadores de filmes”.

O Australian Council on Children and the Media observou que, com materiais portáteis qualificados para maiores de 18 anos, como DVDs e jogos, existe um risco muito maior de que não se proteja sua exposição às crianças. Isso contrasta com os filmes de cinema, dos quais é mais fácil proteger as crianças.

Além disso, afirmaram que, ainda que alguns pais possam estar muito bem informados sobre os riscos e estar atentos para evitar a exposição em seus próprios lares, nem todos estão.

Não é o ideal

No entanto, a Igreja Católica adotou uma postura diferente neste tema. A Conferência Episcopal Australiana emitiu um comunicado estabelecendo que sua opção preferida seria que o material para maiores de 18 anos não estivesse disponível na Austrália.

Mas, dado que já está presente, apesar de ler ilegal, seria preferível introduzir a classificação para maiores de 18 anos nesses jogos, de forma que se possa restringir o acesso a este material por parte de menores.

A comunicação deixou claro que a Conferência Episcopal Australiana não aprova tais videogames. “Em um mundo ideal, o tipo de material que está incluído em filmes e jogos de computador para maiores de 18 anos nunca deveria ser visto em uma democracia civilizada”, comentaram os bispos.

Como este não é um mundo ideal, precisamos resolver a situação da melhor maneira possível. Proibir não é uma opção, pois, de fato, a conferência episcopal afirmou que muito desse material está disponível por meio da internet ou de cópias.

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