segunda-feira, 14 de maio de 2012

O morgadio. Pesados deveres dos nobres


Das obrigações militares da nobreza decorre a maior parte dos seus hábitos.

O direito de morgadio vem em parte da necessidade de confiar ao mais forte a herança que ele deve garantir, muitas vezes pela espada. 

A lei de herança por masculinidade explica-se também dessa forma, pois só o homem pode assegurar a defesa de um torreão.

Por isso também, quando um feudo “cai em roca” (quando uma mulher é a única herdeira), o suserano sobre o qual recai a responsabilidade desse feudo, que ficou assim em estado de inferioridade, sente-se no dever de casá-la. 

Por isso a mulher não sucederá senão após os filhos mais novos, e estes após o mais velho.

Eles só receberão apanágios, daí os desastres que ocorreram no fim da Idade Média terem tido como origem os apanágios excessivamente importantes deixados aos filhos por João, o Bom. 

O poder que receberam tornou-se para eles uma tentação perpétua, e para todos uma fonte de desordens durante a menoridade de Carlos VI.

Os nobres têm o dever de proporcionar a justiça aos seus vassalos de qualquer condição, e igualmente o de administrar o feudo. 

Trata-se do exercício de um dever, e não de um direito.

Implica responsabilidades muito pesadas, já que cada senhor deve dar conta do seu domínio não só à sua linhagem, mas também ao seu suserano. 

Étienne de Fougères descreve a vida do senhor de um grande domínio como cheia de preocupações e de fadigas:

Cà et là va, souvent se tourne,
Ne repose ni ne séjourne:
Château abord, château aourne,
Souvent haitié, plus souvent mourne.
Cà et là va, pas ne repose
Que sa marche ne soit déclose.

Anda de cá para lá, muitas vezes muda de direção,
Não repousa nem se detém:
Castelo dentro, castelo fora,
Muitas vezes alegre, mais vezes triste.
Anda de cá para lá, não repousa
Senão quando o seu caminho está aberto.

O seu poder, longe de ser ilimitado como de maneira geral se julgou, é bem menor que o de um chefe de indústria ou de qualquer proprietário nos nossos dias. 

Nunca tem a propriedade absoluta dos seus domínios, depende sempre de um suserano, e no fim das contas os suseranos mais poderosos dependem do rei. 

Nos nossos dias, de acordo com a concepção romana, o pagamento de uma terra confere pleno direito sobre ela. 

Na Idade Média não é assim. Em caso de má administração, o senhor sofre penalidades que podem ir até à confiscação dos seus bens. 

Deste modo, ninguém governa com autoridade total nem escapa ao controle direto daquele de quem depende. 

Esta repartição da propriedade e da autoridade é um dos traços mais característicos da sociedade medieval.

As obrigações que ligam o vassalo ao seu senhor implicam reciprocidade:
“Tanto o senhor deve fé e lealdade ao seu homem como o homem ao seu senhor”, diz Beaumanoir.

Esta noção de dever recíproco, de serviço mútuo, encontra-se muitas vezes, tanto nos textos literários como jurídicos. Étienne de Fougères observa, no Livre des manières:
Graigneur fait a sire à son homme
Que l'homme à son seigneur et dome.

O senhor deve mais reconhecimento ao seu vassalo
Do que ele próprio deve ao senhor.

Apoiando esta constatação, Philippe de Novare nota:
“Aqueles que recebem serviço e nunca o recompensam bebem o suor dos seus servos, que é veneno mortal para o corpo e para a alma”.

Donde também a máxima: A bien servir convient eür avoir (Para bem servir, convém bom ter).

(Autor: Regine Pernoud, “Luz da Idade Média”. Ed. original: “Lumière du Moyen Âge”, Grasset, Paris, 1944)

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